Ontem, quarta-feira, dia 27/11/24, às 20:30h, o Ministro Fernando Haddad anunciou o muito aguardado pacote de corte de gastos do governo Federal. O Brasil é o país com a maior dívida pública versus PIB da América Latina, conforme Relatório do Goldman Sachs divulgado em novembro/24.

As seguintes altas do preço do dólar frente ao real nos últimos meses contradizem a dinâmica da economia brasileira. Com tendência de crescimento do PIB[1], diminuição do desemprego (com consequente aumento da massa salarial e aumento do consumo) e elevação da taxa de juros para conter a inflação, deveríamos observar a apreciação do real e não ao contrário, como vem ocorrendo.

O mercado financeiro reage às expectativas, dessa forma, simplificadamente, sem um controle de suas despesas o Brasil precisa cada vez mais financiar sua dívida, retirando recursos do setor privado. Numa situação extrema pode chegar à insolvência.

Portanto, um ajuste nas contas públicas é fundamental para que a percepção dos investidores esteja alinhada com a tendência de melhora da economia. Porém, este importante momento de anúncio de corte de gastos foi misturado com isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) para rendimentos mensais até R$ 5 mil e a tributação adicional para rendas superiores a R$ 50mil.

Primeiro, vale lembrar que em julho de 1994, a isenção se dava para rendimentos de até R$ 561,80, o equivalente a R$ 4.611,13 em outubro de 2024 (IPCA de 720,78% no período), ou seja, desta forma, tal correção seria a mais justa para o contribuinte, bem perto do valor de R$ 5mil proposto pelo governo federal.

Em análise jurídica de tal medida há desafios constitucionais para essa reforma do imposto de renda. O primeiro é o Princípio da Anterioridade, ou seja, para que a medida valha já para 2025, há necessidade de aprovação de lei ainda este ano, conforme art. 150, III, “b” e §1º, CF. Se isso não ocorrer, e a lei for aprovada apenas em 2025, terá validade/vigência, apenas em 2026.

Se o governo lançar mão de Medida Provisória para evitar tal atraso, há outra barreira constitucional, já que o art. 62, CF, prescreve que “Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei”. A discussão neste caso é se a matéria é de fato relevante (pode ser), e se é urgente (bem discutível). E mesmo assim, se este obstáculo for superado, a MP deve ser convertida em lei antes do final do ano, conforme o art. 62, §2º, CF.

Vale lembrar que todas essas questões estão relacionadas ao aumento do imposto para rendimentos maiores de R$ 50mil, para as isenções não há qualquer impedimento para a imediata aplicação.

Em síntese, o corte de gastos é essencial para o crescimento econômico e a atração de investimentos privados, a isenção de imposto de renda para salários até R$ 5mil é compatível com a correção monetária que deveria ter sido feita à tabela do imposto de renda, além de ser compatível com o art. 3º, I, CF “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária”. Devemos aguardar a publicação do Projeto de Lei ou da Medida Provisória para podermos opinar mais detalhadamente sobre as propostas centrais para o aumento de tributação dos salários acima de R$50mil.

[1] A estimativa do PIB brasileiro de 2024 está em 3,17%, segundo o último relatório Focus do Banco Central. Importante observar que o mesmo relatório, em dezembro de 2023, apontava um crescimento de apenas 1,52% do PIB para 2024. Ou seja, o Brasil vem surpreendendo com um crescimento acima do esperado.